Ilha de Páscoa: Poike e a busca da Caverna das Virgens

Uma aventura em terras selvagens para encontrar a caverna Ana O Keke


O objetivo deste dia seria explorar a parte norte da ilha de Páscoa. Comecei pelo mais difícil: encontrar a caverna chamada Ana O Keke, a "caverna das virgens", que se localiza em um lugar de difícil acesso no vulcão extinto Poike que é um dos três principais vulcões que levaram à formação da Ilha de Páscoa, sendo o mais antigo deles, surgindo há cerca de 3 milhões de anos atrás. Atualmente está extinto. Essa seria uma das minhas aventuras mais difíceis na ilha.


COMO CHEGAR

Para começar, eu tinha que chegar em Poike que fica localizado na região nordeste da Ilha de Páscoa. Segui com o carro alugado por 20 km na estrada da costa leste. Ao chegar na subida do vulcão, uma porteira próxima do Ahu Tongariki, me deparei com uma placa que só autorizava a entrada a pé ou de cavalo (assim como no Terevaka). 

Localização de Ana O Keke na Península Poike


Eu tinha que alcançar a encosta norte do vulcão e se eu fizesse isso a pé perderia metade do dia e não conseguiria cumprir todo o roteiro. Foi então que achei um caminho em que se podia entrar com o carro, entre a cerca do Poike e um barranco. De maneira inconsequente, entrei com o carro naquela estrada estreita e tomada pela vegetação. Caso houvesse um obstáculo, eu teria que retornar tudo de ré, com o perigo de cair no barranco. Consegui chegar no final daquele caminho, que terminou em uma pedra costeira curva, e tive que estacionar de uma forma que o carro não despencasse.

Passei pela cerca de arame farpado e já estava na área do Poike


Na área do vulcão Poike existem sítios arqueológicos difíceis de encontrar, por isso, quase a totalidade dos blogs de viagem recomendam um guia local. Dentre os pontos arqueológicos está os Papa ui Hetu local de petróglifos usado em observação astronômica, o Vai A Heva, uma cabeça esculpida em cima de uma bacia natural de coletar água da chuva, e a caverna Ana O Keke, também conhecida como "a caverna das virgens", que, aparentemente, foi usada para prender as mulheres jovens por um tempo, a fim de branquear a pele. Essa última era o meu objetivo.

Encontrei as marcas de uma discreta trilha até os 3 montes que são referência


Antes de viajar para a Ilha de Páscoa, pesquisei bastante para descobrir a localização de Ana O Keke, mas não achava em lugar algum. Depois de muita procura no Google, em vários idiomas inclusive, achei um blog alemão descrevendo o caminho para chegar lá. Usei o tradutor para entender o texto, mas eu precisava da localização exata porque ela fica escondida na encosta norte do vulcão.

Poike permite uma caminhada sensacional e momentos de isolamento


Explicação do itinerário do blog de Karsten Rau visto de Maunga Vai A Heva


Foi então que eu resolvi procurar no Google Earth e descobri uma foto da caverna marcada por alguém numa área que combinava com a descrição do blog. Registrei aquelas coordenadas no meu GPS antes de seguir viagem. Voltando ao relato na ilha, já com o carro estacionado, passei pela cerca de arame farpado que dava a cesso ao vulcão e então cheguei na paisagem sensacional de Poike. Continuei subindo em direção a elevação que o GPS apontava. (Coordenadas aproximadas: 27° 05’ 34,04” S  - 109° 14’ 30,93” O).

Mauga Tea Tea e Maunga Vai A Heva são as referências de navegação no terreno 


O vulcão Poike possui 370 metros de altura


Passei por uma vala natural conhecida como "a vala Poike". Diz a lenda que a tribo Hanau E'epe (a classe trabalhadora) viveu na região e que em algum momento da história foram atacados de surpresa pela tribo Hanau Momoko (a classe dominante) que jogou os E'epe na vala e os queimaram vivos.

A vala Poike tem uma história macabra 


Poike forma uma península na ilha que permite ver até a praia de Ovahe


A referência no terreno é seguir em direção a três montes menores chamados Maunga Vai A Heva, Maunga Tea Tea e Maunga Parehe, todos localizados ao norte de Poike. Atrás existe uma floresta de eucalipto plantada pela comunidade local. Procurei seguir próximo da encosta que forma um penhasco de até 200 metros para o mar, é bom ter cuidado para não andar tão próximo da beira.

A área de Poike é o habitat de cavalos que permanecem soltos pela ilha


São cenários assim de isolamento que fazem a Ilha de Páscoa um lugar especial


ANA O KEKE

O GPS me levou até um ponto na encosta e acusou a chegada no objetivo. Procurei algo por perto e vi uma pequena trilha que descia pelas pedras... e cheguei! A descida é curta e relativamente fácil, não oferece muito risco, basta descer por algumas pedras com, no máximo, 2 metros de altura. Se você tiver que usar técnicas de escalada para descer é porque está no caminho errado. 

O caminho segue com um penhasco à esquerda da direção da caverna


Andar muito próximo da beira pode causar uma queda de 200 metros no mar


A porta da caverna é baixa e estreita, para entrar é preciso quase deitar no chão. Se estiver em época de chuvas é pior, pode estar mais enlameada. Uma dica importante é levar uma lanterna. Por dentro, ela fica um pouco mais alta, mas não dá para ficar em pé, é preciso explorá-la abaixado mesmo.

A entrada de Ana O Keke


Esta é a vista de dentro da caverna do Oceano Pacífico


É necessário entrar bem abaixado, no estilo "Homem Aranha"


LENDAS E MISTÉRIOS

A tradição oral da ilha conta que as virgens escolhidas eram trancadas lá por semanas e até meses meses para branquear sua pele, um ideal da beleza antigo da ilha. O que acontecia com a menina não se sabe ao certo. Teorias trazem explicações que vão desde preparativos para festas religiosas até sacrifício ritual. Sabe-se que essa prática tinha relação com o culto do Homem-Pássaro, tendo como a teoria mais aceita que a menina era preparada para ser oferecida ao Tangata Manu, o campeão da competição em Orongo.

É recomendável levar lanterna para explorar o interior


No fundo da caverna o teto fica um pouco mais alto


O chão costuma ser úmido e lamacento


DESENHOS NA PAREDE

O mais interessante é a presença dos petróglifos (desenhos na rocha) feitos nas paredes de Ana O Keke, com figuras até hoje indecifráveis, inclusive semelhantes a glifos usados na escrita Rongorongo (falei sobre essa escrita no post do Museu Rapa Nui). Veja abaixo os desenhos que encontrei nas paredes:

As paredes da caverna estão cobertas por símbolos


Desenhos que parecem um ramo de planta, pontos, uma baleia (?) e um glifo no alfabeto Rongorongo


Estes parecem não possuir formas definidas, mas os pontos continuam


Em outro canto, desenhos menores


Detalhe da figura que se assemelha a um glifo Rongorongo com formas humanóides


Inscrições do Tablete Pequeno de Santiago, escrito em Rongorongo


Qual seria o significado desses petróglifos?


RECOMENDAÇÕES

Chegar em Ana O Keke não é tão fácil assim, e se estiver sem um GPS fica ainda mais complicado achar o ponto certo de descida na encosta. Não precisa ir de carro até o lugar que eu fui, beirando a cerca de carro. Se tiver tempo, é possível cruzar o Poike a pé até avistar os 3 montes ao norte, a partir da entrada da porteira da cerca, próximo ao Ahu Tongariki. Para quem não gosta de perrengue, aconselho contratar um guia e tomar cuidado para não andar muito próximo ao penhasco.

Missão cumprida no isolado norte da Ilha de Páscoa


MEU ROTEIRO

Anterior: CAVERNAS

Roteiro completo: MISSÃO ILHA DE PÁSCOA

Próximo: LA PEROUSE BAY


Comentários

  1. Oi sabe me dizer quanto tempo leva a trilha a pé até essa caverna e o vulcão?

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Sobre o autor

Sobre o autor
Renan é carioca, mochileiro, historiador e arqueólogo. Gosta de viajar, fazer trilhas, academia, ler sobre a história do mundo e os mistérios da arqueologia, sempre comparando os lados opostos de cada teoria. Cada viagem que faz é fruto de muito planejamento e busca conhecer o máximo de lugares possíveis no curto período que tem disponível. Acredita que a história foi e continua sendo distorcida para beneficiar alguns grupos, e somente explorando a verdade oculta no passado é que se consegue montar o quebra-cabeça do mundo.